Desde 2015 está em vigor no Brasil a chamada “Lei do Caminhoneiro”, que trouxe mudanças significativas para essa classe de trabalhadores e para as empresas da área de transporte rodoviário de cargas.
Dentre as mudanças mais conhecidas, estão a jornada de trabalho, as pausas de descanso, os revezamentos ao volante, a remuneração e as infrações de trânsito que foram incluídas no Código de Trânsito Brasileiro, sendo a mais conhecida as penalidades decorrentes da falta do exame toxicológico.
Mas, uma das principais alterações para a classe e que “quase” caiu no esquecimento, foi a obrigatoriedade da empresa destinatária da carga de descarregar a mercadoria em até 5 horas, contados da chegada do veículo ao destino.
Apesar de não ser uma norma criada pela Lei do Caminhoneiro, a alteração trazida pela Lei facilitou a caracterização do “Dano Material”, já que caminhão parado representa a perda da remuneração do caminhoneiro, o que chamamos de “lucro cessante”.
Também trouxe uma norma de atualização anual dos valores, evitando assim que a norma se torne defasada, a ponto de não ser mais aplicada.
A intensão do legislador foi muito simples: Evitar que as empresas que compraram a carga utilizem o caminhão do transportador como um armazém, como um depósito de suas mercadorias.
No caso de atraso na descarga, ultrapassadas as 5 horas previstas em Lei, fica caracterizado o lucro cessante do transportador, já que impede que a utilização do veículo para o transporte de outras mercadorias enquanto estiver parado.
Ou seja, a partir da 6ª hora, o transportador tem em seu favor um crédito de natureza indenizatória, devido pela empresa contratante/destinatária do produto, sempre que houver demora injustificada na operação de descarga do veículo.
Mas como calcular o quanto é devido pela empresa?
Segundo a regra, o calculo deve ser feito com base no valor de R$ 1,90 (um real, noventa centavos) por tonelada/hora ou fração.
A dúvida que se tinha era se a “fração” descrita na lei era para as horas ou era para a carga do veículo.
De acordo com algumas decisões judiciais, o cálculo deve ser feito pela quantidade de carga transportada no momento em que permaneceu parado, o que representa um erro, pois o lucro cessante deve comportar a quantidade de carga que o veículo efetivamente deixou de transportar enquanto permaneceu parado e não a que estava transportando.
Essa celeuma também foi resolvida pela Lei do Caminhoneiro, que estabeleceu o calculo com base na capacidade total de transporte do veículo.
Assim, uma carreta que transporte uma carga de 27 toneladas, que permaneça parada aguardando a descarga por 12 horas, 7 horas a mais do que o prazo máximo permitido, geraria um credito no valor de R$ 615,60 (seiscentos e quinze reais, sessenta centavos) em favor do transportador, por conta do “incidente de espera”.
Mas as 5 horas que o destinatário dispunha para realizar o desembarque, não devem ser abatidas do valor total?
Não.
Após o prazo, essas 5 horas são incorporadas ao total devido pela empresa.
Mas a demora na descarga não é um risco da profissão?
Não, não existe qualquer fundamento jurídico para essas justificativas, que são muito difundidas no setor.
Primeiro, porque o risco pela demora da carga/descarga somente pode ser suportado pelo transportador até a 5ª hora após a chegada da carga ao destino, ou seja, a própria Lei 11.442 se encarregou de limitar os riscos da profissão.
Segundo, porque clausulas excludentes de responsabilidade no contrato de compra/venda, realizado entre vendedor/expedidor e comprador/destinatário, não são oponíveis ao transportador.
Assim, ao negar o pedido de pagamento pela demora na descarga da mercadoria, resta constituída a mora do contratante, dando azo à cobrança via judicial.
Nesse caso, além dos valores devidamente corrigidos, deve incidir sobre o montante os juros pela demora no pagamento além dos honorários advocatícios e despesas judiciais, se for o caso.
Posso deixar de entregar a mercadoria no caso de demora injustificada?
Não, não pode.
Essa também era uma prática estimulada por alguns sindicatos, mas que vem sendo rechaçada pelos tribunais.
Se de um lado o caminhoneiro/transportador tem o direito de ter a carga descarregada em um determinado limite de tempo, sendo autorizado pela empresa destinatária a descarregar, não pode o transportador se negar à entrega das mercadorias sob o argumento de que não recebeu a indenização devida pela demora.
Isso porque, após a formalização do crédito pelos documentos que comprovam a chegada do veículo às dependências do destinatário e o atraso na operação de descarga ultrapassando as 5 (cinco) horas, o meio adequado de proceder a cobrança é via administrativa ou judicial, não havendo justa causa na recusa em descarregar o veículo além de constituir o exercício arbitrário das próprias razões, ato ilícito que pode ensejar indenização por dano moral à empresa contratante ou à destinatária do produto.
A empresa pode me colocar na “lista negra” de transportadores, impedindo que eu carregue novamente?
Essa é, sem dúvidas, a condição que mais leva os caminhoneiros/transportadores a abrirem mão das estadias.
Apesar da insistente afirmação de que tal bloqueio não existe e que as empresas só exercem o direito à livre escolha de contratação, na prática o que tem ocorrido é justamente a proibição do transporte de cargas unicamente daqueles transportadores que demandaram em juízo para receber as indenizações.
Seguindo as normas constitucionais, o princípio da livre iniciativa deve estar lado a lado com os valores sociais do trabalho, sempre em harmonia e equilíbrio.
Assim, a autonomia da empresa em contratar aquele transportador que melhor se ajuste aos seus interesses não pode se sobrepor ao direito constitucional do exercício do trabalho, impossibilitando que transportadores sejam contratados somente por terem exigido um direito previsto em lei.
Nesse caso, havendo provas de que o bloqueio realmente existiu, cabível a indenização por dano moral do transportador.
E como eu faço para cobrar esse crédito?
Apesar de ter a característica de “indenização”, a cobrança desses valores pode ocorrer via administrativa, através de pedido de reembolso feito diretamente pelo advogado de trânsito que presta serviços ao transportador ou ao caminhoneiro, diretamente à empresa contratante e havendo a negativa do pagamento extrajudicial, a cobrança deve ser feita através de Ação Indenizatória de Dano Material.
Nesse caso, além dos valores devidos, devidamente corrigidos, a empresa contratante/destinatária arcará com as custas judiciais, além dos honorários do advogado.
Autor: VAGNER OLIVEIRA. Advogado Especialista em Direito de Trânsito. Autor do livro “Infrações de Trânsito sob a ótica do Defensor de Condutores”. Professor de Direito de Trânsito.

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