APRESENTAÇÃO DE CONDUTOR INFRATOR FORA DO PRAZO

Uma das grandes dificuldades que tenho observado em meus alunos e nos profissionais que atuam com direito de trânsito, diz respeito justamente à apresentação de condutor, quer seja pela perda do prazo administrativo, quer seja pela falta de notificação para apresentação do condutor ou pela recusa do condutor em se apresentar como infrator.

O que poucos profissionais sabem é que existe a possibilidade de realizar a apresentação de condutor infrator mesmo fora do prazo, tanto na via administrativa quanto via judicial.

Evidentemente que não se trata de um processo tão simples mas é perfeitamente possível evitar que o proprietário responda por atos que não praticou, ainda que o condutor se recuse a se apresentar como real infrator.

QUANDO EU NÃO POSSO APRESENTAR CONDUTOR

Primeiramente, diferentemente do que muitos pensam, nem sempre é possível apresentar o condutor infrator.

Existem infrações que são de responsabilidade exclusiva do proprietário do veículo e sempre que ocorrerem, o proprietário já será identificado como sendo o infrator, mesmo que não esteja conduzindo o veículo no momento da abordagem.

Essa regra está descrita no artigo 257, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro:

Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.

§ 2º Ao proprietário caberá sempre a responsabilidade pela infração referente à prévia regularização e preenchimento das formalidades e condições exigidas para o trânsito do veículo na via terrestre, conservação e inalterabilidade de suas características, componentes, agregados, habilitação legal e compatível de seus condutores, quando esta for exigida, e outras disposições que deva observar.

Por exemplo, independentemente de “quem” estiver conduzindo o veículo, no caso de “pneu careca” quem responde como infrator é o proprietário do automóvel, pois ele é o responsável pela sua conservação. Da mesma forma, se o veículo estiver com o “licenciamento atrasado”, faltando “equipamento obrigatório” ou com suas “características alteradas”, quem responde exclusivamente como infrator é o proprietário do bem.

Nesses casos, mesmo que o veículo seja abordado e o auto de infração preenchido em nome do condutor, a responsabilidade pelo cometimento da infração recairá sobre o proprietário do veículo, que será penalizado com a multa e os pontos decorrentes da infração.

Isso porque, não se tratam de infrações por desrespeito às normas de circulação ou regras de conduta, portanto, não podem serem atribuídas ao prontuário do condutor.

QUANDO EU POSSO APRESENTAR CONDUTOR

A essa altura, você já entendeu que só cabe apresentação de condutor infrator quando a infração for por desrespeito a uma norma de circulação ou regra de conduta.

Isso é o que diz no artigo 257, § 3º:

Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.

§ 3º Ao condutor caberá a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção do veículo.

Por exemplo: Infrações por “avanço de sinal vermelho”, “excesso de velocidade”, “falta de cinto de segurança”, “manobras perigosas”, “desobedecer ordens do agente de trânsito”, como são decorrentes de normas de circulação e regras de conduta, são de responsabilidade do condutor que as praticou.

Nesse caso, havendo a abordagem, o próprio agente fiscalizador identificará o condutor infrator, preenchendo o auto de infração em seu nome e isentando o proprietário do veículo dos pontos ou da suspensão do direito de dirigir, se for o caso de infração com penalidade de suspensão direta, como na embriaguez, por exemplo.

Não havendo abordagem, o proprietário será notificado para apresentar o condutor.

Não o fazendo, será considerado como “CONDUTOR PRESUMIDO”, ou seja, o órgão de trânsito “presume” que como não foi apresentado um condutor, quem “cometeu” a infração foi o proprietário do veículo.

QUEM TEM A OBRIGAÇÃO DE APRESENTAR O CONDUTOR?

Se formos buscar uma lógica para a apresentação do condutor, chegaremos à conclusão de que “se o condutor cometeu uma infração, nada mais justo que ele se apresente voluntariamente ao processo e assuma as consequências de seus atos”.

Não é assim tão fácil.

Segundo determina o Código de Trânsito Brasileiro, a obrigação de identificar o real infrator é dividida entre o agente fiscalizador e o proprietário do veículo.

Nos termos do artigo 280, cabe ao agente da autoridade de trânsito o esforço inicial para identificar o condutor que foi “flagrado” cometendo a infração de trânsito:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

[…]

IV – o prontuário do condutor, sempre que possível;

[…]

VI – assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração.

[…]

§ 3º Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração, informando os dados a respeito do veículo, além dos constantes nos incisos I, II e III, para o procedimento previsto no artigo seguinte.

Somente no caso de impossibilidade de autuação em flagrante é que esse esforço para identificar o real infrator passará ao proprietário do veículo.

Art. 257, § 7º Não sendo imediata a identificação do infrator, o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, na forma em que dispuser o CONTRAN, ao fim do qual, não o fazendo, será considerado responsável pela infração.

Entretanto, apesar de ambos terem a obrigação de tentar identificar o condutor infrator, no caso de impossibilidade para o agente de trânsito, a responsabilidade recairá sobre o proprietário e a este, havendo a impossibilidade de apresentar o condutor, responderá pela infração cometida.

Em outras palavras, a Lei desonera o agente de trânsito e onera sobremaneira o proprietário, sendo que, muitas vezes, seria mais fácil o agente fiscalizador abordar o veículo e identificar o infrator.

QUAL É O PRAZO PARA APRESENTAR CONDUTOR?

Não havendo autuação em flagrante e sendo uma infração por desrespeito à uma regra de circulação ou norma de conduta, o proprietário do veículo deverá ser notificado e informado sobre a autuação, tendo o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar o real infrator:

Art. 257, § 7º Não sendo imediata a identificação do infrator, o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, […].

Primeiramente, a norma não é tão simples quanto aparenta ser.

Antes de iniciar o prazo para apresentação de condutor, o órgão de trânsito tem o prazo de 30 (trinta) dias para expedir a notificação ao proprietário do veículo, caracterizada pela entrega da notificação no correio, quando utilizada remessa postal.

Depois de ter sido notificado, o proprietário do veículo terá mais 15 (quinze) dias de prazo para identificar o condutor infrator.

Observe que esse é o prazo mínimo legal que deve ser ofertado ao proprietário, não havendo prazo máximo, que fica a critério do órgão de trânsito.

A maioria dos órgãos de trânsito oferecem um prazo limite para a apresentação do condutor, que varia entre 30 (trinta) e 60 (sessenta) dias da data do cometimento da infração, entretanto, esse prazo apesar de parecer suficiente, pode esbarrar em situações que ocasionem o atraso na notificação do proprietário, como greves de correio, local sem cobertura para entrega da correspondência, proprietário que não está na residência para receber a correspondência e outros incidentes de notificação, que impedem que a notificação seja entregue rapidamente.

Nesses casos, havendo a comprovação de que o proprietário recebeu a notificação com prazo inferior ao mínimo estabelecido pelo Código de Trânsito Brasileiro e não conseguiu apresentar o condutor até a data limite imposta pelo órgão de trânsito, é possível realizar o pedido de REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO para que seja aceito o condutor infrator mesmo que o prazo tenha se esgotado.

Evidentemente que esse pedido deve ser realizado o quanto antes, preferencialmente, antes da imposição da penalidade de multa e abertura de prazo para recurso à JARI.

E SE O CONDUTOR SE RECUSAR A SE APRESENTAR?

Como já foi dito, a obrigação de apresentar condutor infrator é dividida entre a administração (Art. 280, IV e VI) e o proprietário do veículo (Art. 257, §7º), sendo que o ônus pela não apresentação recai apenas nesse último, que é responsabilizado pela infração cometida, adquirindo a figura de “condutor presumido”.

Não existe no Código de Trânsito Brasileiro qualquer tipo de penalidade dirigida ao condutor infrator que recusar-se a fornecer seus dados ao proprietário do veículo e tão pouco uma forma de indicar o condutor sem a sua anuência, contra a sua vontade.

Isso deixa o proprietário em uma situação de desvantagem em relação ao condutor infrator.

Não quer dizer, entretanto, que não exista uma forma de proceder a apresentação do condutor infrator, tanto na esfera administrativa quanto na esfera judicial.

Administrativamente, havendo a comprovação documental de que o condutor exerce atividade remunerada com o veículo no qual foi cometida a infração, ainda que se recuse a assinar o formulário de identificação de infrator, o exercício da atividade remunerada no veículo faz presumir o nexo entre a infração cometida e o condutor, não havendo motivos para que o órgão de trânsito indefira a apresentação do condutor.

Mas se o condutor for eventual, ou seja, não exerce atividade remunerada como motorista e utiliza o veículo esporadicamente (Ex: O proprietário emprestou o veículo ao condutor; O funcionário utilizou o veículo para entregar uma mercadoria ou documento, etc) o proprietário pode buscar na justiça o reconhecimento do real infrator, através de uma “AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER”. Nesse caso, devem existir provas documentais ou testemunhais de que o condutor realmente utilizou o veículo, cometeu a infração e se recusa a assumir a responsabilidade.

O CONDUTOR NÃO SE RECUSA, MAS PERDEU O PRAZO PARA APRESENTAÇÃO

O prazo previsto para apresentação de condutor tem características de “preclusão administrativa”, ou seja, é um prazo necessário para que a administração conclua, em um prazo aceitável, o processo de imposição da penalidade de multa.

Entretanto, essa preclusão não afeta o direito do proprietário de apresentar judicialmente o condutor infrator. Aliás, a busca pela verdade real é uma das premissas de nosso ordenamento jurídico, sendo perfeitamente possível que essa pretensão seja reconhecida judicialmente.

Nesse caso, tanto o condutor infrator quanto o proprietário do veículo devem fazer parte do polo ativo da demanda, ajuizada contra o órgão que lavrou a autuação, em uma AÇÃO DE APRESENTAÇÃO DE CONDUTOR.

Evidentemente que não pode haver indícios de fraude nesse tipo de pretensão, por exemplo, o Pai querendo ser reconhecido como real condutor infrator em infração por demonstrar manobra perigosa praticada no veículo de propriedade de seu filho. Fica claro a tentativa de fraudar o processo administrativo apenas para que o filho não seja penalizado.

Não é aconselhável que esse tipo de ação seja ajuizada entre pessoas muito próximas, como pai e filho, cônjuges, irmãos, etc.

E NO CASO DE VEÍCULO VENDIDO EM QUE AS MULTAS ESTÃO CHEGANDO PARA O ANTIGO PROPRIETÁRIO?

Nesse caso, havendo a prova documental de que o veículo foi vendido, até mesmo as infrações de responsabilidade exclusiva do proprietário podem ser questionadas, pois bens móveis transferem a propriedade pela sua simples entrega pelo vendedor ao comprador, independentemente da transferência administrativa junto ao órgão de trânsito.

Assim, havendo um contrato de venda e compra, com as cláusulas de responsabilidade civil e sendo demonstrado a impossibilidade de transferência no DETRAN pelo fato do veículo ser financiado, nada impede o reconhecimento judicial do real infrator, ainda que se trate de infração de responsabilidade exclusiva do proprietário.

Nesse caso, sugiro uma AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE VENDA E COMPRA, com o pedido de que seja comunicada a venda ao DETRAN, independentemente da alienação do bem à financeira.

CONCLUSÃO 

Essas são apenas algumas das situações que possibilitam apresentar condutor fora do prazo.

Poderíamos listar uma enormidade de outras situações que trazem essa condição, por exemplo:

  • Processo administrativo de apresentação de condutor indeferido pelo órgão de trânsito
  • Falta de notificação do cometimento da infração com prazo para apresentar condutor
  • Infrações em veículo arrendado ou locado e muitas outras.

O fato é que é possível realizar uma apresentação tardia do condutor infrator, tanto na esfera administrativa quanto judicialmente, inclusive em relação a infrações que já originaram outras penalidades, como a suspensão do direito de dirigir, a cassação da habilitação ou mesmo a perda da carteira provisória.

Mas para isso é preciso que o defensor de condutores consiga analisar quais foram as condições que levaram à perda do prazo administrativo e quais são os remédios mais adequados para reverter essa situação, revertendo a penalidade imposta à pessoa inocente.

Aliás, esse é o grande princípio que rege a apresentação tardia de condutor: A busca pela verdade real e a impossibilidade de penalizar pessoa inocente por ato que não cometeu.

10 comentários em “APRESENTAÇÃO DE CONDUTOR INFRATOR FORA DO PRAZO

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    1. O prazo para apresentação começa a fluir A PARTIR DA NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETARIO e não de sua expedição pelo correio. Sugiro enviar a apresentação fora do prazo, explicando e comprovando que recebeu pelo correio sem prazo hábil para apresentação. Abraço.

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  1. APRESENTAÇÃO DE CONDUTOR INFRATOR FORA DO PRAZO pode ser feita pelo próprio infrator ou apenas judicialmente através de advogados?

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  2. Eu enviei para o DNIT via correio registrado (tenho o aviso de recebimento) 3 multas em nome de minha esposa e foi recebido em Brasília dentro do prazo, no dia 21/05/2018. O vencimento do prazo de apresentação seria dia 24/05/2018. Até agora, de acordo com o site do DETRAN, não aconteceu nada; as multas continuam em meu nome. O que posso fazer? Com essas 3 multas vou atingir o máximo de pontuação (20 pontos).

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  3. Estou aguardando o curso referente ao assunto. Por enquanto somente faço as orientações de como proceder judicialmente.

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  4. Levei uma multa do DNIT só que o veículo está em nome da minha esposa e eu tenho a ppd só que a multa vai pro nome de minha esposa pois e a dona do veículo e não tem CNH se ela não apresenta nenhum condutor tem algum problema

    Curtido por 1 pessoa

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