Alguns DETRANS, especialmente do estado do Paraná, vêm cancelando carteiras de habilitação emitidas há dois, três, quatro anos atrás, com base no lançamento tardio de pontos por infrações ocorridas durante o período em que o condutor era permissionário, com base no artigo 148, § 3º, do Código de Trânsito Brasileiro, que diz:
Art. 148. Os exames de habilitação, exceto os de direção veicular, poderão ser aplicados por entidades públicas ou privadas credenciadas pelo órgão executivo de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, de acordo com as normas estabelecidas pelo CONTRAN.
- 3º A Carteira Nacional de Habilitação será conferida ao condutor no término de um ano, desde que o mesmo não tenha cometido nenhuma infração de natureza grave ou gravíssima ou seja reincidente em infração média.
Elencamos aqui 4 razoes jurídicas pelas quais esse cancelamento é irregular:
Primeiro, a emissão da Carteira Nacional de Habilitação pressupõe que os requisitos previstos no artigo 148, § 3° do Código de Trânsito Brasileiro foram devidamente cumpridos. Presume-se, portanto, que se trata de um ato jurídico perfeito, cujo direito se torna adquirido, não podendo o DETRAN, ao argumento de estar diligenciando para corrigir um erro cometido há um, dois ou tres anos atrás, retirar do condutor o direito que já se tornou estável.
Segundo, a emissão da carteira nacional de habilitação definitiva constitui ato vinculado, quando preenchidos os requisitos do Código de Trânsito Brasileiro, não havendo espaço para juízo de conveniência e oportunidade da Administração e somente pode ser anulado se constatado em processo administrativo a irregularidade em sua expedição, desde que garantido o direito de ampla defesa e contraditório ao condutor, como acontece nos processos de suspensão e cassação da CNH.
Terceiro, não é possível estender o prazo de duração da carteira provisória (PPD) para além de um ano. Isso porque, ao termino desse prazo e com a obtenção da carteira definitiva (CNH), o documento anterior passa a não mais existir. Portanto, o computo de pontos em um documento que já está extinto contraria a própria lógica estabelecida pelo Código de Trânsito Brasileiro, pois nesse caso o DETRAN estaria cassando (art. 263, CTB) a habilitação do condutor, travestindo seus atos na forma de cancelamento da permissão para dirigir (art. 148, §3º, CTB).
E, sendo tais atos incompatíveis, opera-se a preclusão lógica do ato administrativo, não podendo o DETRAN exigir o reinicio do processo de habilitação.
Quarto, ao utilizar o mesmo artigo 148, § 3º para inicialmente expedir a carteira nacional de habilitação e posteriormente para cassá-la, voltando-se contra o ato que ele próprio (DETRAN) praticou, comete ato jurídico inaceitável, descrito na expressão venire contra factum proprium.
É o famoso “disse, mas estou desdizendo”.
Parece uma problemática simples de ser resolvida, bastando que o DETRAN compute os pontos tardios na carteira nacional de habilitação emitida e não na extinta carteira provisória do condutor.
Muitos transtornos aos usuários poderiam ser evitados tomando tais medidas, entretanto, parece que evitar transtornos não é um dos princípios do DETRAN, ainda mais quando estes rendem aos cofres públicos novas taxas de reabilitação, que, diga-se de passagem, não são nenhum pouco baratas.
Deixe um comentário